sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Um dia vou escrever um romance...para já começo por um ensaio (Cap. II)

Cap II

O inverno está a terminar e Camila já sente o aquecer do sol no seu coração. O dia a dia é cada vez mais uma azafama, o trabalho de professora de História absorve-a de tal forma que já só se lembra de António, muito de quando em vez.


A campainha toca! São 8H30, mas Camila, como é costume, já está dentro da sala, à espera dos alunos para mais uma aula sobre II Guerra Mundial. Os alunos entram, sentam-se nos lugares de sempre, dão os bons dias, falam entre si, enquanto Camila, abstraída, lá vai preparando a sala de aula.
Camila começa a falar sobre um dos períodos mais importantes da história, empolgando-se cada vez mais, percorrendo os corredores entre as carteiras, interrompendo o raciocínio, cada vez que um dos seus atentos alunos faz uma intervenção.
A aula é de 90 minutos, mas alunos e professora sentem-se tão envolvidos que, sem darem conta do tempo, rapidamente soa a campainha e… amanhã há mais.
Camila continua sentada em cima da secretária, a observar atentamente os alunos que arrumam os cadernos e os livros e começam a sair lentamente e a comentar aquilo que ouviram. A professora sente-se feliz, porque percebe que eles gostaram da aula.

 Estamos a meio da manhã, hora do lanche. Na escola havia um pequeno snack bar exclusivo para os professores, mas ela gostava mais de se juntar aos alunos e conviver com eles. Era nesse intervalo que aproveitava para conversar e saber das preocupações e gostos dos mais novos. Mas nesse dia foi diferente, Camila chegou ao bar e os alunos lá estavam a rir e a conversar, como sempre, mas, ao contrário do que era costume, Camila sentiu um vazio. De repente, a sombra do António pairou sobre ela do nada, como que dando um soco no seu coração e um misto de saudades e desprezo invadiu-a. Naquele momento, ela não entendeu o que aconteceu e esqueceu esses pensamentos (pelo menos tentou), tendo entrado na conversa dos seus alunos com quem já estava habituada a falar a essa hora. Lá lhe foram contando, o que fizeram no fim de semana, as noites que passaram e o quanto se divertiram. Camila também falou do seu, que não foi muito diferente, já que gostava muito de sair e divertir-se.
De repente, olha para o relógio e já estava na hora de mais uma aula, agora com outros alunos, mas com o mesmo entusiasmo e  vontade.
Terminou mais um dia de trabalho, igual a tantos outros, mas com um sabor sempre especial, porque Camila gostava do que fazia.
Depois daquele sobressalto, no seu coração de manhã, a professora não mais se tinha lembrado daquele homem/menino que a abandonou e fez sofrer, mas agora que o dia terminou, que chegou a casa e se sentou confortavelmente no sofá, Camila pensou no que acontecera de manhã e tentou perceber o porquê, se aquela pessoa já pouco pairava no seu pensamento, já pouco mexia com o seu coração (pelo menos pensava isso).
Por uns instantes, a imagem de António tomou conta do seu pensamento e ela, que, no fundo, ainda queria saber dele, lá começou a reviver tudo aquilo que tinham vivido, todas as histórias que tinham partilhado e o quão frágil ele era. Sem que desse conta, mais de uma hora passou, ali num recordar de tudo o que tinham vivido, de tudo o que tinham feito. Ela sorria, chorava, sem se dar conta, mas estava feliz, porque o recordava com carinho, embora ele, se calhar, não merecesse.
Envolvida nos pensamentos que a levaram meses atrás, estremeceu com o toque do telemóvel. Do outro lado, uma voz meiga e terna, pergunta como está e se quer tomar um café. Ela fica atordoada, era um amigo que não via há algum tempo, mas por quem sempre nutriu empatia e, diga-se, alguém bem-apessoado. Ela ainda atónita, pelo pensamento no António e pelo convite de alguém que já não via há muito, lá disse que sim, tendo marcado para o fim de semana seguinte.
A semana decorreu normalmente, sem grandes novidades, mas Camila lá ia pensando naquele convite estranho, mas ao mesmo tempo tentador, já que ele não era de se deitar fora. A semana de Camila, dividida entre a casa e a escola, com uns cafés e uns lanches com os amigos lá pelo meio, terminou, até que o sábado chegou e tinha o seu café com o amigo José.
O despertador tocou como habitualmente às sete, mas Camila desligou porque era sábado e muito cedo para se levantar. Durante mais de meia hora ficou ali deitada a pensar no que poderia acontecer mais logo no cafezinho e os pensamentos levaram-na  a adormecer e acordar ao meio dia. Num ápice levantou-se, tomou um banho e foi tratar do cabelo, não podia falhar logo.
O dia decorreu normalmente, Camila só pensava em como iria ser. Chegou a hora de se vestir. Abriu as portas do guarda-fatos e começou a dificuldade de escolher a roupa. “Um vestido preto, fica sempre bem”, pensou, “mas podia também escolher uma cor mais apelativa”. Estava indecisa, mas lá optou pelo preto, porque era a cor com que se sentia mais confortável.
Bem estava quase na hora, já estava pronta, faltava apenas o perfume. Depois, agarrou rapidamente a chave do carro, que estava em cima do bengaleiro, fechou a porta de casa e lá foi em direção ao encontro. À chegada, o coração começou a bater e ela começou a pensar, no que iria conversar. Mas, agora já não havia tempo para pensar, nem para desmarcar.
Nove da noite, hora marcada, ela entra pelo salão de chá, em plena baixa da cidade, e ele lá está com olhar misterioso e sorriso maroto nos lábios. Ela, nervosa, tremia por todos os lados, mas não demonstrava nem um bocadinho. Lá se aproximou, cumprimentou-o com dois beijos que pareciam intermináveis e sentou-se.
- Que tomas? – disse ele.
- Um café. Não foi para um café que me convidaste?! – disse ela, num tom irónico, com voz rouca e insinuante.
Ele disfarçou e lá pediu o café. Ambos ficaram ali a conversar sobre as vidas de cada um, sobre o seu trabalho e sobre os seus projetos.
Depois do café e de mais de duas horas de uma agradável conversa, o que fazer? Ficaram os dois a discutir e decidiram-se por beber um copo, num qualquer bar da cidade e lá foram. Cá fora, embora o inverno tivesse a chegar ao fim, as noites ainda eram frias e ele, apercebendo-se que ela estava com frio, passou-lhe a mão por cima do ombro e seguiram a pé, como se de um casal de namorados se tratasse. Seguiram ambos calados, e ela começou a imaginar o que poderia ser daí para a frente. Ele era interessante, giro e muito carinhoso. De repente, já estava longe, muito longe, sendo trazida de volta à terra pela voz rouca de José que avisou que estavam a chegar. Ao entrar, ouvia-se bem alto Wake me Up, de Avicii, uma das musicas do momento que ela gostava particularmente e que percebeu que ele também era fã. Depois, foi pedir a bebida e ficarem ali a dançar, com uns toques inocentes, mas denunciadores de que a noite ainda agora começara.
Saíram do bar, o dia já queria clarear e lá foram abraçados até ao carro dela. Agora era a hora da despedida, o coração começou a palpitar e ela a pensar o que se iria passar? Pois, foi o que pensou, ele agarrou-a pelo pescoço e deu-lhe um beijo intenso, cheio de significado. Ambos ficaram ali a apreciar o momento.

- Foi uma noite muito agradável. Espero que tenha sido a primeira de muitas – disse ele.
Ela olhou-o a medo e acenou com a cabeça, concordando com o que acabara de ser dito.

Entrou no carro ainda atónita e o caminho até casa foi dominado por pensamentos. Ora o José, ora o António. “Outra vez o António? Mas que raio, ele já era”, pensava ela irritada, mas o que é certo é que não consiga deixar de pensar nele também.

Deitou-se a pensar na dualidade do seu coração e ficou à espera que ele decidisse…

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